INTRÓITO

Subverter, Exorcizar, Viver, Beijar, Amar, Odiar, Saber, Piratear, Analisar, Mover, Parar, Rejuvenescer, Envelhecer... Tudo isso e nada. Petit Subversion é só um diário de alguém comum - de Anatólia... um fantasma.

domingo, 27 de abril de 2008

Nick Cave - Live In Brazil para baixar:

Nick Cave - Live In Brazil, 1989
(134.45 MB)

http://www.filesend.net/download.php?f=2695b8f471e25ac367a6de6afb2c40ea

Do Blog: Lágrima Psicodélica:
http://lagrimapsicodelica.blogspot.com/2008/04/nick-cave-live-in-brazil.html
Post Atualizado.

Ou só a Lágrima:
http://lagrimapsicodelica.blogspot.com/

ASAS DO DESEJO À POESIA DE REINER MARIA RILKE

(Cena que abre o filme - Anjo Damiel)

Os anjos catalisadores do filme “Asas do Desejo” de Wim Wenders renunciam a imortalidade para provar uma xícara de café e um cigarro. Os anjos ouvem os pensamentos dos humanos, perpassam pelo cotidiano catalisando as dores e emoções que eles não são capazes de sentir; vêem o mundo com seus olhares sem cores, sentem as coisas e os objetos sem sentir; são capazes de roubar uma materialidade para tentar provocar alguma sensação. A dimensão de dois mundos (mundo angelical espectro e mundo humano paixões-desejos) é confrontada com a realidade da dor – a dor da 2º Guerra Mundial. A dimensão do real vem a tona com as imagens da Alemanha dividida pela guerra. O mundo espectral e onírico dos anjos é de um mundo sem angústias embora lamentem a eternidade e aparentemente invejem os humanos, mas não se angustiam como os humanos no seu cotidiano banal, em suas pobres vidas mortais. Asas do desejo nos oferece uma colagem de teorias filosóficas, uma espécie de síntese da humanidade – vai de Rilke (As Elegias de Duíno), Homero, Kierkegaard, Nietzsche, Sartre, Walter Benjamin... as pinturas de klimt ao roteirista do filme (Peter Handke) ...
Em Kierkegaar encontramos algo mais ou menos assim: A angústia é a diferença que nos faz humanos. A angústia é humana! É isso que nos diferencia dos anjos e dos animais.
Em Walter Benjamin: O que é o anjo do futuro? Ele está com a cara voltada para o passado e não consegue prever o futuro – a memória já é fragmentada, a história é fragmentada.

Asas do Desejo prevalece como uma grande obra prima do cinema; é sempre bom rever. É um filme carregado de poesia, encanto, dor e angústia. As musas de Homero são outras, a morte nos angustia, mas ainda assim podemos degustar um café e nos pulverizarmos interiormente com a fumaça de um cigarro que carrega nossas angustia em 5 minutos de fumaça. A Angústia nos faz humanos – humanos que não conseguem vislumbrar um futuro, tudo é incerto, nossa memória se fragmentou, apesar da oralidade fluir,porém só a partir de uma leitura singular... Só o sonho ainda pode nos transportar para a realização de nossos desejos – desejos de anjos, desejos de humanos, mas nunca esquecer que a angústia vem de nossos desejos mais profundos e desconhecidos.

O filme de Wim Wenders tem profunda reflexão sobre a subjetividade, sobre a humanidade, sobre a contemporaneidade, sobre o futuro e principalmente sobre as paixões humanas que por último constroem as primeiras. É muito para minha pobre associação livre do momento. Nada termina aqui. O filme ainda possui fantástica fotografia da dupla de velhinhos: Henri Alekan e Louis Cochet além de uma gótica e ótima trilha sonora composta por Jürgen Knieper, seguida por acordes de rock end roll com as bandas: Crime & The City Solution a tocar Six Bells Chime. E ainda Nick Cave ao lado dos Bad Seeds a tocarem a mítica From Her to Eternety. Uma das seqüências mais lembradas pelos admiradores do filme é aquela em que o Anjo Damiel, ao seguir a sua amada Marion pelas escurecidas ruas de Berlin, acaba entrando em um clube underground e presencia a sensacional performance de uma banda tocando uma melancólica canção de melodia sombriamente bela: "Six Bells Chime".

Um poema de Reiner Maria Rilke:

O Anjo
*
Com um mover da fronte ele descarta
tudo o que obriga, tudo o que coarta,
pois em seu coração, quando ela o adentra,
a eterna Vinda os círculos concentra.
O céu com muitas formas Ihe aparece
e cada qual demanda: vem, conhece -.
Não dês às suas mãos ligeiras nem
um só fardo; pois ele, à noite, vem
à tua casa conferir teu peso,
cheio de ira, e com a mão mais dura,
como se fosses sua criatura,
te arranca do teu molde com desprezo.

****************************************
Um Fragmento das Elegias de Duíno:

PRIMEIRA ELEGIA
*
Quem se eu gritasse, me ouviria pois entre as ordens
Dos anjos? E dado mesmo que me tomasse
Um deles de repente em seu coração, eu sucumbiria
Ante sua existência mais forte. Pois o belo não é
Senão o início do terrível, que já a custo suportamos,
E o admiramos tanto porque ele tranqüilamente desdenha
Destruir-nos. Cada anjo é terrível. E assim me contenho pois, e reprimo o apelo
*
De obscuro soluço. Ah! A quem podemos
Recorrer então? Nem aos anjos nem aos homens,
E os animais sagazes logo percebem
Que não estamos muito seguros
No mundo interpretado. Resta-nos talvez
Alguma árvore na encosta que diariamente
Possamos rever. Resta-nos a rua de ontem
E a mimada fidelidade de um hábito,
Que se compraz conosco e assim fica e não nos abandona.
Ó e a noite, a noite, quando o vento cheio dos espaços
Do mundo desgasta-nos o rosto -, para quem ela não é /sempre a desejada,
Levemente decepcionante, que para o solitário coração
Se impõe penosamente. Ela é mais leve para os amantes?
Ah! Eles escondem apenas um com o outro a própria sorte.
Não o sabes ainda? Atira dos braços o vazio
Para os espaços que respiramos; talvez que os pássaros
Sintam o ar mais vasto num vôo mais íntimo.
*
Sim, as primaveras precisavam de ti.Muitas estrelas
Esperavam que tu as percebesses. Do passado
Erguia-se uma vaga aproximando-se, ou
Ao passares sob uma janela aberta,
Um violino se entregava. Tudo isso era missão.
Mas a levaste ao fim? Não estavas sempre
Distraído pela espera, como se tudo te ansiasse
A bem amada? (onde queres abrigá-la
Então, se os grandes e estranhos pensamentos entram
E saem em ti e muitas vezes ficam pela noite.)
Se a nostalgia te dominar, porém, cantas as amantes; muito
Ainda falta para ser bastante imortal seu celebrado sentimento.
Aquelas que tu quase invejaste, as desprezadas, que tu
Achaste muito mais amorosas que as apaziguadas.
Começa Sempre de novo o louvor jamais acessível;
Pensa: o herói se conserva, mesmo a queda lhe foi
Apenas um pretexto para ser : o seu derradeiro nascimento.
As amantes, porém, a natureza exausta as toma
Novamente em si, como se não houvesse duas vezes forças para realizá-las. Já pensaste pois em Gaspara Stampa
O bastante para que alguma jovem,
A quem o amante abandonou, diante do elevado exemplo
Dessa apaixonada, sinta o desejo de tornar-se como ela?
Essas velhíssimas dores afinal não se devem tornar
Mais fecundas para nós? Não é tempo de nos libertarmos,
Amando, do objeto amado e a ele tremendo resistirmos
Como a flecha suporta à corda, para, concentrando-se no salto
Ser mais do que ela mesma? Pois parada não há em /parte alguma.
*
Vozes, vozes. Escuta, coração como outrora somente os santos escutavam: até que o gigantesco apelo levantava-os do chão;
mas eles continuavam ajoelhados,
inabaláveis, sem desviarem a atenção: eles assim escutavam.
Não que tu pudesses suportar a voz de Deus, de modo algum.
Mas escuta o sopro, a incessante mensagem que nasce do silêncio. Daqueles jovens mortos sobe agora um murmúrio em direção /a ti.
Onde quer que penetraste, nas igrejas
De Roma ou de Nápoles, seu destino não falou a ti, /tranqüilamente?
Ou uma augusta inscrição não se impôs a ti
Como recentemente a lousa em Santa Maria Formosa.
Que eles querem de mim? Lentamente devo dissipar
A aparência de injustiça que às vezes dificulta um pouco
O puro movimento de seus espíritos.
*
Certo, é estranho não habitar mais terra,
Não mais praticar hábitos ainda mal adquiridos,
Às rosas e outras coisas especialmente cheias de promessas
Não dar sentido do futuro humano;
O que se era, entre mãos infinitamente cheias de medo
Não ser mais, e até o próprio nome
Deixar de lado como um brinquedo quebrado.
Estranho, não desejar mais os desejos. Estranho,
Ver tudo o que se encadeava esvoaçar solto
No espaço. E estar morto é penoso
E cheio de recuperações, até que lentamente se divise
Um pouco da eternidade. - Mas os vivos
Cometem todos o erro de muito profundamente distinguir.
Os anjos (dizem) não saberiam muitas vezes
Se caminham entre vivos ou mortos. A correnteza eterna
Arrebata através de ambos os reinos todas as idades
Sempre consigo e seu rumor as sobrepuja em ambos.
*
Finalmente não precisam mais de nós os que partiram cedo,
Perde-se docemente o hábito do que é terrestre, como o /seio materno
suavemente se deixa, ao crescer.
Mas nós que de tão grandes mistérios precisamos, para quem do luto tantas vezes o abençoado progresso se origina - : poderíamos passar /sem eles?
É vã a lenda de que outrora, lamentando Linos,
A primeira música ousando atravessou o árido letargo,
Que então no sobressaltado espaço, do qual um quase /divino adolescente escapou de súbito e para sempre, o vazio entrou naquela vibração que agora nos arrebata e consola e ajuda?
*
- Reiner Maria Rilke -

Traduções do poeta paraense Paulo Plínio Abreu

domingo, 20 de abril de 2008

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Alguns autores: Grayling, Reich, Eco, Tolkien, Morus, Kaczinsky, Adorno, Spinioza, Kierkgaard, Beauvoir, Shakespeare, Sartre, Schoupenhauer, Gurps, Rousseau, Steiner, Nietzsche, Morton, Weissman, Scocuglia, Almeida, Dershowitz, Moore, Hoffman, Huxley, Bernacchi, Azevedo, Nunes, Cabral, Breton, Dartigues, Lacouste, Bauman, Ming, Sargant, Voltaire, Nabokov, Moraes, Hugo, King, Camus, Virgínia Woolf, Caio Fernando Abreu (OBRA COMPLETA), Capra, Drummond, Castañeda, Chico Buarque, Clarice Lispector, (E muito mais).......
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O que é ser artista? O que é escrever? (De Violet Trefusis para Vita Sackville-West)

(Escrivaninha de Vita)

25 de janeiro de 1918

Era uma vez, uma artista e uma mulher, e a artista e a mulher eram uma só pessoa. No decorrer do tempo, a mulher se casou; ela se casou com o príncipe de seus sonhos, e uma alegria irreversível e imutável desceu sobre ela. A artista foi temporariamente esquecida: envolvida em um confortável torpor, a artista dormiu, e a mulher exultou em sua condição de mulher e na felicidade que podia proporcionar...
Certo dia a artista despertou para encontrar a câmara de seu sono encolhida e distorcida, as janelas se tornaram muito pequenas, ela mal podia enxergar fora delas, os brocados estavam esmaecidos; os adamascados e cetins pendiam como fantasmas... Debilitada pelo pânico ela correu para sua janela; viu uma mulher brincando em um gramado macio com uma criança sorridente. Naquele momento, elas se encontraram; confrontaram-se uma com a outra, a mulher serena, amorosa, imperturbável, e a artista desafiadora, ciumenta, irritada diante da resistência. E a artista manteve-se firme e escarneceu da mulher. Pobre artista: Cigana desgrenhada e irresponsável, era mais do que ela podia suportar – Agora a mulher pertencia de coração e alma a seu marido e a seus filhos, mas a artista não pertencia a ninguém, ou antes à humanidade. Imaginária, ela divaga pela terra, hoje aqui, amanhã ali – o mundo é apunhalado pelas flores inúteis de sua proteção...
A combinação da mulher e da artista produziu uma espécie de mentalidade tão rara quanto sublime; um artista, seja na pintura, na música ou na literatura, deve necessariamente pertencer a ambos os sexos, seu julgamento é bissexual, deve ser completamente impessoal, e ele deve ser capaz de se colocar com impunidade no lugar de cada sexo.
O resultado deste equilíbrio intelectual foi tornar você de repente consciente da sabedoria de séculos nos olhos desta mulher; uma mulher de perfeita verdade, límpida, clara, intocada pela instabilidade do homem – você compreendeu que ela tinha em si algo de uma verdade eterna, de uma beleza eterna, adiante, muito adiante do alcance de nossa débil compreensão... Algo tão velho quanto as montanhas, tão velho quanto o mundo, porém eternamente jovem, eternamente inatingível... Algo divino, olímpico, vertiginoso, que vê até mesmo aquilo que é menos conhecido para si do plano da compreensão e da comiseração superlativas. A lira sonora que é concebida a um dentre mil silenciosos – o artista, sim! O artista que deve ser nutrido diariamente com novas intuições, novas condições, novos amores e novos ódios para se manter cantando para a humanidade! O artista – o supremo luxo que os deuses lançam ao mundo quando se percebe que ele deve se expressar ou morrer!
E a mulher talvez sorria quando ler isso, e seus amigos lhe dirão que esposa e mãe ideal ela é, o que é verdade, mas a artista se retrai horrorizada com a imputação de presunção que essas palavras não conseguem ocultar –
Deus sabe que é esteticamente incorreto o artista ser contido pela domesticidade. Pégaso é arriado a uma charrete, Marisa toca harmônio. Fecho meus olhos, e pareço ver, apesar dos atributos semelhantes aos de Demétrio com os quais a mulher é sem dúvida dotada, não a mulher, mas a artista galgando os cumes das montanhas, silenciosa, inspirada e só.

(Esta carta não foi assinada por Violet)

- As Cartas de Amor de Violet Trefusis para Vita Sackville-West-
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Para fazer uma análise deste conteúdo é preciso entender alguns fatos, fazer uma reconstituição dos passos cotidianos da vida de Violet e Vita, ao menos, neste período, nesta data, específica, da carta. Os ocorridos deste meio tempo é que ditam o conteúdo manifesto desta carta tão deslumbrante, genial. O que Violet fez foi uma análise ímpar... Para este mero trabalho sem propósito algum (nem por isso irresponsável), também usaremos de nossas possíveis associações – associações livre. Como não temos nenhuma pretensão, o que vai ditar o rumo desta analise são meras associações de coisas apaixonantes que podem se ligar, assim como podem se separar sem nunca terem combinado, como uma tórrida paixão.
Violet tinha 22 anos quando escreveu esta carta, estava, nesta época, fazendo aulas de arte, o que sem dúvida influenciou neste discorrido, além de ter trabalhado numa cantina de soltados em 1917(vendo os horrores da guerra) e sentindo-se muito solitária. Durante os anos de 1914 e 1918 pouco se encontraram. Neste período transcorria a 1º Guerra Mundial. Época contrariamente de felicidade familiar para Vita. Em 1914 nascia seu primeiro filho com Harold Nicolson. E em 1917 nasceu o segundo filho, Nigel (que aparece dando depoimento na biografia de Virginia Woolf no filme “As Horas”). Neste tempo, Vita parecia se dedicar ao lar feliz, o que provavelmente fazia Violet corroer-se de ciúme, de dor e distanciamento. A paixão queimava em fogo lente, esperando o momento oportuno para entrar em erupção. Isso ocorreu em 13 de abril de 1918, quando Violet foi visitar Vita sozinha, no seu novo endereço em Long Barn (mas isso é outra história).
Voltemos à análise do conteúdo textual. O que Violet quer dizer com a frase “era uma vez uma artista e uma mulher, e a artista e a mulher eram uma só pessoa.?” E ela continua dizendo que a mulher se casou e a artista foi temporariamente esquecida.... Dá muito na cara, não tem mistério o que Violet manda como mensagem para Vita. Ora, Vita queria ser uma artista, estava escrevendo um romance. Mas como ser artista e dona de casa, ou no melhor dos termos um mulher submissa aos filhos e marido, quando desejava ser a toda poderosa Vita Sackville-West – uma mulherzinha, para ser chula. Era isso que Vita desejava para si mesma? Violet conhecia muito bem os temperamentos de seu “Julian”, e queria abrir os olhos da outra, ou melhor, estava chamando Vita para pensar, para refletir sobre sua posição e antes de tudo, chamando Vita, novamente, para a tórrida paixão. Tem um fundo provocativo, com certeza.
Faremos uma referência a vida de Sylvia Plath, que não tem relação nenhuma com o romance nem vida social de Violet e Vita, mas responde a questão de ser uma artista e ser uma mãe de família, diria assim. O que nos interessa é somente a produção literária. A obra de Sylvia Plath não faz o menor sentido sem a vida dela. É preciso casar vida e obra. Sylvia só escrevia quando tomada de grande sofrimento e enquanto feliz e casada não produziu nada. Quando lemos uma poesia desta autora sem saber da autoria, logo, pensamos, quem escreveu só pode ser um amador, ou alguém desequilibrada, quase um psicótico, pelas palavras desconexas (mas não quero entrar no mérito agora, deixemos a posteriori). Mas pensando neste ponto, nos dirigimos a questão do que é escrever? Parece mesmo ser preciso uma boa dose de sofrimento psíquico para fazer uma grande produção. “O artista deve ser nutrido diariamente com novas intuições, novas condições, novos amores e novos ódios para se manter cantando para a humanidade” – escreveu Violet.
Vita estava sendo contida pela domesticidade do lar, da família, e enquanto fosse levada pela vida feliz nada que preste artisticamente seria produzido. Ao que tudo indica Violet lhe chama a atenção, “vá viver outras coisas mulher, entregue-se à bissexualidade, à paixão e venha para os meus braços, pois só assim poderá encontrar o veio artístico dentro de você”. Violet não disse isso com estas palavras; fez melhor, produziu uma pequena tese sobre o assunto. Fico conjecturando, que a grande inspiração e o veio artístico de Vita é o resultado de sua convivência e romance com Violet – o grande alimento, o maná da vida “desregrada”, “imoral”, “irracional”, ao contrário da vida de luxo, tédio, requinte e nobreza da herdeira do nome Sackville-West – Violet é o veneno e o remédio que os deuses mandaram. Pensemos qual o artista que não se entrega de corpo e alma na letra, na tinta, ou em qualquer outra produção? É preciso entrega e se há entrega também há grande dose de dor, de paixão, de amor – passio, phatos. A arte é uma catarse – sublimar é elevar o sofrimento ao lugar de tópos, de transformação – superação. É preciso que Vita se entregue a Violet – acordar Mytia e Julian do sono profundo da futilidade para que ele, vestido de fantasias tome Alushka, e se lancem, ambos, no paraíso do prazer e da arte. Um lugar distante de toda a pomposa e esnobe sociedade inglesa – herdeira da moral vitoriana. O tópos de Violet é a paixão incomensurável onde mora a intelectualidade e lubricidade – a beleza. E a melhor parte disso é que em abril de 1918 Vita se entrega, mesmo que temporariamente, ao mundo de Violet.
Anatólia A.

sábado, 12 de abril de 2008

Castelo Knole: Verdadeira paixão de Vita Sackville-West

Apenas 1 dos 365 quartos de Knole

Pintura do Castelo Knole - 1880

Ilustração do Castelo Knole - Enciclopédia Britânica 1709

Interior do Castelo Knole - uma das tantas galerias

Vista de Knole, mesmo olhar da pintura de 1880

Frente do Castelo Knole
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O Castelo Knole ou a casa Knole, localizada próximo a Kent, Inglaterra, possui 365 cômodos, supostamente um para cada dia do ano. Sua construção foi iniciada em 1456 por Thomas Bourchier, arcebispo de Canterbury.
A escritora Vita Sackville-Weste viveu boa parte de sua vida neste imenso e luxuoso castelo. A família de Vita em 1888, com a morte do tio Mortimer, Primeiro Lord Sackville, retornou a Inglaterra e tomou posse do castelo. O pai de Victoria (mãe de Vita) se tornou o Segundo Lord Sackville e por direito herdeiro da grande mansão ancestral de 365 quartos, originalmente cedida a Thomas Sackville pela Rainha Elizabeth em 1566.
O interresante é que o castelo só poderia ser herdado pelos filhos homens. Por tanto, a mãe de Vita, Victoria, não perdeu tempo e casou-se com seu primo em primeiro grau, que se tornaria herdeiro direto, o Terceiro Lord Sackville, chamado Lionel Sackville-West. Desta união é que nasceu Vita Sackville-West em 9 de março de 1892.
Como vita era mulher perdeu todo o direito ao título de Herança ancestral. Filha única e não filho único. Esta foi uma das maiores dores de Vita, com certeza, é por isso que ela cresceu desejando tanto ser um homem - para ser "enaltecida", ao invés de "oprimida".
Inspirada em Vita e em seu Castelo, ou melhor, o Castelo que Vita desejou possuir como Herança, a escritora Virgínia Woolf, produziu a obra "Orlando, a mulher imortal". Bem, Vita perdeu Knole e Violet... mas ganhou um romance...

Carta de Violet Trefusis para Vita Sacckville-West

30 de junho de 1918

Men tilich, foi um inferno me separar de você hoje. Deus, como adoro e desejo você. Não imagina quanto... A noite passada foi perfeita... Estou orgulhosa de você, minha doçura, delicio-me em sua beleza, sua beleza de forma e de traços. Exulto com minha rendição, hoje, embora nem sempre isso tenha ocorrido. Querida, se seu romence tivesse sido escrito em francês, inevitavelmente teria sido batizado de “Domptée” (Dominado, isto é, subjugado).
Mitya, sinto tanto a sua falta – não me importo com o que eu digo – Adoro pertencer a você – regozijo-me de que apenas você ... tenha feito com que eu me submetesse às suas vontades, destroçasse minha autopossessão, me espoliasse de meu mistério, me tornasse sua, sua, de tal forma que longe de você nada sou senão uma boneca inútil! Uma casca vazia. Alushka precisa não se envergonhar de ser a amante de Dmitri... pelo contrário!...
Por que eu me preocupo com o que lhe digo? Se fiz algo, foi acrescentar algumas “cortinas” às minhas maneiras em benefício das outras pessoas, mas para você não há cortinas, nem mesmo as mais leves! Exulto ao saber como temos pouco em comum com o mundo...

Sua Lushka

QUEIME ESTA! Prometa.

domingo, 6 de abril de 2008

Múmias I


Caramba, depois de não sei quantos anos, revejo um dos filmes de Indiana Jones, isso me trouxe inumeráveis recordações engraçadas e sonhadoras. Lembrei-me de uma época em que eu queria porque queria ser arqueóloga. Estudar arqueologia parecia ser fascinante, um mundo de mistérios e pesquisas revelariam a origem do homem, da civilização. Sonhos de aventura percorriam meu imaginário e Indiana Jones era o cara. Viajar o mundo, ver o deserto, as pirâmides e o berço da filosofia me encantavam. Coisas velhas, empoeiradas, mofadas, mal cheirosas e abandonadas me fascinavam. Catava todas as porcarias que pensava serem de alguma utilidade histórica. Possuía sacos de variados tipos de pedras, livros rasgados e comidos por traças. Coisas e mais coisas úteis e inúteis eram amontoadas, encaixotadas em meu sótão interno e externo. Tinha meu laboratório e sala de estudos onde fantasiosamente analisava os achados. Morei num lugar cheio de histórias, os arredores eram “povoados” por casas abandonadas, resquícios de uma época de ouro, de uma época que as pessoas vinham a Vila da Água – este lugar foi uma antiga colônia de férias da década de 50 e 60. Época que não se viajava tanto para a praia ou para lugares mais distantes – contingências de um tempo, contingências de um lugar interiorano. Bem, as casas abandonadas eram minhas pirâmides, minha Grécia, meu El Dorado. Que maravilha! Não sei se fui uma vândala, uma ladra, mas muitos objetos antigos surrupiei do vilarejo abandonado. Livros raros e esquisitos encontrei e guardei. Não me sinto tão imoral por ter feito o que fiz, porque a maioria das casas foi destruída e ninguém preocupou-se em reconstituir, preservar, restaurar. Lembro-me que há uns dez anos atrás, talvez quinze, umas das casas mais bacanas foi demolida e todos os objetos que estavam em seu interior foram jogados no lixo, destruídos, queimados, quebrados.... que triste. A casa pertenceu a um Major do Rio de Janeiro e que veio servir aqui no sul. A família deste major era amiga da minha avó. Mas pouco lembro... É... Lembranças... As casas abandonadas eram meu refugio, minha fantasia, meu sonho e coisas sombrias, misteriosas e cheias de desejos lá moravam. Beijos velados lá também aconteciam. Encontros fortuitos às escondidas, nossa que calafrio. A moça mais linda da vila lá beijei e sentimos muito medo – medo de nós e medo dos outros. Mais isso é outra história. Hoje não sou arqueóloga, mas quase isso, faço, talvez, uma arqueologia da alma, da Psykhé humana. E também penetro nas casas e sótãos escuros, lugares muito estranhos povoados de relíquias passadas – tesouros antigos.

Mas falemos de coisas históricas e científicas, aproveitando um dos achados vou transcrever uma passagem de um livro que é considerado o Romance da Arqueologia, lá dos idos de 1949, uma passagem sobre Múmias:

“Heródoto descreveu as cerimônias fúnebres e a embalsamação que ainda estavam em voga no Egito depois de uma de suas viagens: “ Se morre alguma personalidade importante, as mulheres da casa cobrem a cabeça e até o rosto com terra. Depois deixam o morto, precipitam-se para fora da casa e percorrem a cidade com as roupas arregaçadas, descobrindo o peito e golpeando-o com as mãos. Todas as parentes se juntam ao cortejo e procedem do mesmo modo. Os homens cingem-se também e batem no peito. Depois destas cerimônias levam o cadáver para ser embalçamado.”
O cadáver era assim tratado geralmente: primeiro extraiam-lhe o cérebro pelas fossas nasais com o auxílio de um gancho de metal; depois com uma faca de pedra faziam-lhe a incisão da barriga, tirando-lhe os intestinos (o que muitas vezes provavelmente se fazia pelo ânus), que eram colocados nos chamados “canopos” (bilha ou vaso); finalmente era extraído o coração e substituído por um escarabeu de pedra. Seguia-se uma boa lavagem externa e uma “salgação”, onde o cadáver ficava mais de um mês. Por fim era novamente secado – o que, podia levar de 70 a 77 dias.
O amortalhamento tinha lugar freqüente em vários ataúdes (a maioria dos quais tendo a forma do corpo humano) ou sarcófagos, ou então vários ataúdes de madeira, uns dentro dos outros, eram colocados num sarcófago de pedra. O corpo ficava em posição deitada, com as mãos cruzadas sobre o peito ou com os braços estendidos ao longo do corpo. Os cabelos eram geralmente cortados curtos, nas mulheres muitas vezes deixados compridos e lindamente ondulados. O púbis era raspado. Para evitar a deformação, recheavam o corpo de argila, areia, resinas, serragem, rolos de pano de linho, adicionando a tudo isso drogas aromáticas e, singularmente cebolas. Até os seios das mulheres eram recheados. Começava então o processo com certeza demorado do envolvimento: corpos impregnados pelo betume.” (p. 155-156)

Deuses Túmulos e Sábios: O Romance da Arqueologia
_C. W. CERAM_

Agony:

Angústia: O sujeito apaixonado, do sabor de uma ou outra contingência, se deixa levar pelo medo de um perigo, de uma mágoa, de um abandono, de uma reviravolta - sentimento que ele exprime sob o nome de angústia.
- Fragmentos de um Discurso Amoroso -

Desejo

Um efêmero detalhe pode (e vai) trazer a mais viva lembrança da memória (para a memória). Com os desejos mais profundos também funciona assim, um signo – basta um signo para que voltemos ao tempo – um lugar, é bem verdade, atemporal.
Quando as Psykhes flutuavam, bastava que elas sugassem uma pequena gota de sangue para voltarem a relembrar. Nossos desejos são iguais, basta que bebam um pouco de sangue e revivem, renascem do escuro que tentamos deixa-los. Desejos não podem e nunca serão estancados, perpetuam até o último momento de nossas vidas.

sábado, 5 de abril de 2008

Tisanas de Angústia (3º parte da Angústia)


“Era o tipo de mulher de subúrbio mesquinho, que vare a casa, lava as panelas e prega os botões com as dores do parto, pare sozinha e se levanta três dias depois, vai tratar da vida. Vida infeliz, vida porca. O homem para um lado, ela para outro, arrastando a filha pequena, a barriga deformada, estazando-se, agüentando pancadas nos olhos. Talvez estivesse na véspera de ter menino, talvez estivesse no dia, talvez já sentisse as entranhas se contraírem. Rebolar-se-ia dentro de algumas horas na cama dura, a carne cansada se rasgaria, os dentes morderiam as cobertas remendadas. E o macho ausente, ninguém para ir chamar a parteira dos pobres. Uma vizinha tomaria conta da casa, faria o fogo, prepararia tisanas, aos repelões, rosnando:
- Porcaria. – Que gente!
Depois ofereceria consolações:
- Tenha paciência. Isso vai logo. Faça força.
A mulher tinha desaparecido, a banda do rosto passara cravando-me o olho carregado de ódio. Eu não sentia desejo de rir. Na calçada um ventre extraordinário ia inchando, ventre que tomava proporções fantásticas. Os transeuntes atravessavam aquela barriga transparente, às vezes paravam dentro dela, e isto era absurdo, dava-me a idéia de gestações extravagantes.
Agora havia duas imagens distintas: uma barriga que se alargava pela cidade e a mulher que mostrava apenas um pedaço da cara. Nessa parte visível, endurecida pelo sofrimento, pouco a pouco se esboçavam as feições de Marina. Os cabelos, que a mulher tinha grisalhos, tornavam-se louros. A bochecha era pintada, a metade da boca excessivamente vermelha, o olho único muito azul.”

ANGÚSTIA – Graciliano Ramos – 1936 (p. 142,143)
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A Angústia é pior que o medo - ela não tem representação, não sabemos o que vem. Deixa o sujeito num estado de imobilidade e paranóia. A Angústia não tem um objeto é um afeto flutuante que perdeu as relações de intercâmbio. É um vazio de sentido... Um muro começa a ser levantado, tijolos e mais tijolos vão se encaixando... The Wall. O prazer é perigo e o perigo é angústia... O desejo é angustiante.