INTRÓITO

Subverter, Exorcizar, Viver, Beijar, Amar, Odiar, Saber, Piratear, Analisar, Mover, Parar, Rejuvenescer, Envelhecer... Tudo isso e nada. Petit Subversion é só um diário de alguém comum - de Anatólia... um fantasma.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

GAZA

By José Saramago

A sigla ONU, toda a gente o sabe, significa Organização das Nações Unidas, isto é, à luz da realidade, nada ou muito pouco. Que o digam os palestinos de Gaza a quem se lhes estão esgotando os alimentos, ou que se esgotaram já, porque assim o impôs o bloqueio israelita, decidido, pelos vistos, a condenar à fome as 750 mil pessoas ali registradas como refugiados. Nem pão têm já, a farinha acabou, e o azeite, as lentilhas e o açúcar vão pelo mesmo caminho. Desde o dia 9 de Dezembro os camiões da agência das Nações Unidas, carregados de alimentos, aguardam que o exército israelita lhes permita a entrada na faixa de Gaza, uma autorização uma vez mais negada ou que será retardada até ao último desespero e à última exasperação dos palestinos famintos. Nações Unidas? Unidas? Contando com a cumplicidade ou a cobardia internacional, Israel ri-se de recomendações, decisões e protestos, faz o que entende, quando o entende e como o entende. Vai ao ponto de impedir a entrada de livros e instrumentos musicais como se se tratasse de produtos que iriam pôr em risco a segurança de Israel. Se o ridículo matasse não restaria de pé um único político ou um único soldado israelita, esses especialistas em crueldade, esses doutorados em desprezo que olham o mundo do alto da insolência que é a base da sua educação. Compreendemos melhor o deus bíblico quando conhecemos os seus seguidores. Jeová, ou Javé, ou como se lhe chame, é um deus rancoroso e feroz que os israelitas mantêm permanentemente actualizado.

sábado, 3 de janeiro de 2009

SIAMÉSICO*


“E não se esqueçam que em vossos lares tudo é muito mais falso do que aqui.”
- Jean Genet –
*

Acredita em espíritos superiores? São como víboras que comem energias das pobres almas – sugando eu’s dos reflexos...
Sabe, durante a noite eu não durmo, fico fazendo listas, lembrando rostos, lendo Nietzsche e a lista telefônica. Uma vez arrisquei um nome, corri o dedo de olhos bem fechados até marcar stop crazy. Ela atendeu ao telefone após três chamadas, acho que esperava a minha indiscrição. Ela possui uma passividade bem humana – sobrevivente e artificial. Confessei desejos e misteriosamente presenças, que não quero revelar, materializaram-se, senti um perfume na pele e o coração pulsou mais forte. Fiz uma caçada silenciosa por longas semanas, meses... beber, lamber, saciar a sede atrevidamente. Os nossos olhos queimavam-se neles mesmos, nada mais além de tua íris castanha e tuas pupilas dilatadas... Milagres não acontecem todos os dias e juntar corpo com corpo é uma estupidez emocionante, coisas que o ser racional aprimora diariamente, distraidamente para fugir do cotidiano – não é uma epifania? Para aceitar o imprevisto, nós premeditamos. Tudo bem, eu confesso o meu crime, sou impessoal demais! E minha bondade de caráter é uma arte.
Todos os dias eu te segui e todos os dias até te morder, me abstive de outros corpos. Posso, nesse instante, desenhar as violetas de tua janela, lembro da cor, da dor e do sabor. Posso te conjugar no pretérito mais que perfeito, porque é uma mulher de imprevisível sabor... olhos de víbora, assim como os meus. Você me comeu e roubou o meu reflexo. E agora, quem sou?


* Vínculo Siamésico é o mais angustiante de todos os vínculos mãe-bebê, no sentido de que a criança pode experimentar a separação da mãe como se acarretasse a morte das duas, ou a impossibilidade de sobrevivência de uma delas, o que poderia acontecer, por exemplo, na situação parasitária ou na simbiótica, tal como observamos em determinadas esquizofrenias e em certos processos psicóticos. (Teoria do Vínculo – Pichon-Rivièe)