INTRÓITO

Subverter, Exorcizar, Viver, Beijar, Amar, Odiar, Saber, Piratear, Analisar, Mover, Parar, Rejuvenescer, Envelhecer... Tudo isso e nada. Petit Subversion é só um diário de alguém comum - de Anatólia... um fantasma.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

O AMOR SECRETO DOS SUPER-HERÓIS


Tarde da noite. Robin deitado numa confortável cama de casal, num dos quartos da mansão Wayne em Gothan City, toda decorada com Super-Heróis. Veste apenas a máscara e uma ridícula mini-cueca estampada com morcequinhos cor-de-rosa. O quarto está na penumbra, na vitrola toca “Batdance” do Prince.

De repente, fazendo o maior barulho, acendendo todas as luzes, entra Batman, abatido, roupa amassada com rasgões nos ombros, com sangue seco no nariz e canto da boca.

Robin: Santa madrugada Batman, isso são horas de chegar em casa?
Batman: Ai... não me toque! Tô morta! Ai que horror, que música mais brega que tá tocando, credo.
Robin: Santa ignorância! É “Batdance” do Prince, meu ídolo.
Batman: Credo, tira esta prostituta sudaneza daí, põe um disco da Gal, ai, eu adoro a Gal.
Robin: Você sabe que não suporto esta perua brasileira. Mas não muda de assunto. Onde você esteve sua bat-galinha? Posso apostar que estava outra vez com o Coringa. Você não pensa um pouco em mim? Me deixa aqui sozinho nessa mansão enorme e fica por aí galinhando pelas ruas de Gothan City. Bem que mamãe me disse para aceitar o convite e ir trabalhar com o Capitão América.
Batman: (coloca um disco da Gal) Você? Simplesmente ridículo todo fantasiado de bandeira, andando com aquele escudo para cima e para baixo. Coisa mais pobre! Sou mais ligada no Thor. Ele com aqueles cabelos longos, dourados, musculoso, com aquele imenso martelo cheio de poder, é a glória. Você já pensou, ele de salto alto, ficaria lindérrima.

Gal: “Aonde você vai tem uns amigos que você precisa conhecer...”

Batman: (tirando a máscara frente ao espelho) Tô um caco! Não suporto mais essa vida de combate ao crime. Queria ser amado e não ficar batendo na cara dos bofes.
Robin: Santa choradeira... E eu? Também quero ser amado. Você não pensa um pouco em mim? Também já não suporto mais ver você chegando em casa de madrugada, sujo, com sangue, um trapo velho. Isto não é vida para mim. Vou voltar para a casa da mamãe e não adianta me buscar, nem mandar flores, agora chega!
Batman: (fala olhando-se no espelho) Esses garotos prodígios... Não te esqueças que te ensinei tudo bofete, tudo, e agora vens com ofensas, não é? Que injustiça. Oh destino cruel e insano, oh vida bandida e ingrata. Eu nunca deveria ter virado homem morcego. Olhe bem para mim: não pareço um guarda-chuva velho? E ainda tenho que suportar criança me enchendo o saco. Queria viver, viver, ouviu? Ser a Mulher Maravilha, tá legal?!
Robin: Santa frescura batman, Mulher Maravilha? Você tem que ser forte, durão!
Batman: (puxando os cabelos) Mas não quero, não quero. Esse corpo só quer ser acariciado. Porque não virei uma borboleta? Uma esbelta butterfly-man, toda colorida, alegre, delicada. Eu tô morta. Pode sumir daqui se quiser, sei quando sou rejeitada.
Robin: Santa desilusão Batman. É assim que você me trata? Depois de tudo que fiz por você, seu morcegão bofe! Vou embora mesmo. Pode ficar com essa droga de bat-anel que me deu no ano passado, com este bat-vibrador de três velocidades, que, aliás, quase me matou eletrocutado, e pode ficar com esse horroroso bat-baby-doll e pode ficar com este morcego de pelúcia que te dei no nosso noivado. Pode ficar com tudo. Vou embora desta mansão sombria e escura.
Batman: (berrando) Ah é? Ah é? Tá boa, santa! Você não vai ver bat-lágrimas nos meus olhos, não mesmo. Estou cansada, cansada de você, do Comissário Gordon, de ser combatente, de tudo. Some daqui, seu ingrato.
Robin: Santa sacanagem, eu jamais esperava isso de você.

Gal: “... desta vez doeu demaaaaisss...”

Batman: E para de falar santa a toda hora, odeio ser santa. O-D-E-I-O!!! Sou uma mulher do povo, oh que vida, uma mulher jovem ainda.
Robin: Santa viadagem, mulher?
Batman: (urrando) É, mulher, mulher morcego!
Robin: (gritando) Santíssima bicha! Agora é demais, vou embora.
Batman: (berrando) Vai, o que está esperando? Some da minha vida boy-prodígio, não vai me fazer falta. Garotos como você acho aos montes no Morcegay.
Robin: Santa nojeira batman, você freqüentando o Morcegay? Que decadência!

(Entra Alfredo, o mordomo de Batman)

Alfredo: Por favor, rapazes, parem com essa gritaria, a vizinhança vai pensar o quê?
Batman: (furioso) Olha a audácia dela. Oras, conheço você desde os tempos que colecionava pôsters do Super-Man. Não vem com esse papo moralista pra cima de mim não, sua velha solteirona. Conheço seu passado, sei que ia vestida de mulher-gato no Gala-Gay, sua... sua recalcada.
Alfredo: Patrão, por favor, fale mais baixo.
Robin: Santa raiva, batman...
Batman: Saia daqui Robin e pode levar sua tia velha junto.
Alfredo: Tia velha é a pu... quer dizer, acalme-se patrãozinho. Relaxe, os vizinhos estão ouvindo.
Robin: Santa decadência Alfredo! Isso sempre acontece nas noites de lua cheia. A bicha fica impossível, histérica. Vou cair fora desta droga de mansão.
Batman: (histérica) Vai!!! Some daqui já. Alfredo, meu leque. Ai, me segura, acho que vou desmaiar.
Alfredo: Patrão, não grite assim, todo mundo vai saber que você e o batman são a mesma pessoa.
Batman: E daí? Que importa? Sou assumida, entendeu?
Robin: (chorando) Santa besteira!
Batman: Senta aonde querido?
Robin: Santa surdez, não é senta, é Santa. Alfredo, faça ele se acalmar.
Alfredo: Patrão deite aí na bat-cama e tome o seu prozak... tudo vai ficar bem...
Batman: (pulando, gritando) Mas eu não quero deitar. Eu quero ser a Gal (abraça a capa do disco) quero ser você perua-man.
Robin: Santa frustração Batman, para com isso. Olha eu não vou mais embora, fique calmo amor.
Batman: Não! Está tudo acabado, tudo. Suma da minha frente bat-ingrato e leva esta bat-tia junto, suas horrorosas, nojentas. Vida ingrata. Quero morrer... morrer. Nunca mais serei o mesmo, chega de ser Batman. Cansei de andar por aí disfarçado de macho pelas ruas de Gothan, acabou, tudo, tudo.
Robin: (abraçando Batman) Santa recaída. Vem pra cama, vem amor. Eu perdôo tudo. Deita aqui, assim.
Alfredo: A sociedade jamais nos entenderá, é a vida.
Batman: (chorando, sendo levado pra cama por Robin) O prozak bateu! Maldito Bat-Kane! Ele podia me ter transformado numa borboleta linda, toda rosa e dourada.
Robin: (deitando Batman na cama, fazendo carinhos em seus cabelos) Durma querido. Amanhã será outro dia. O He-man vem nos visitar.
Alfredo: Durma patrão, boa noite.
Batman: Vira o disco da Gal, Alfredo!

Gal: “... Amanhã será jamais...”

Robin apaga as luzes. Gal continua cantando solitária. A cena acaba na manhã seguinte com o Coringa invadindo o quarto da mansão, surpreendendo o bat-casal na mais caliente intimidade.


Obra-produto de total imaginação de J. R. Scóz com arranjos de A. Akkale.(Publicado no Tom Zine nº 20 Ano 3 – 1999)

Um comentário:

Mara* disse...

No ano passado, em São Paulo, infelizmente não pude assistir, por morar a quilómetros de distância, estreou no teatro: ‘A Vida Secreta de Batman e Robin’. Na peça discutiu-se as relações íntimas e os conflitos heróicos da heróica dupla dinâmica que dormiam juntinhos na batcaverna. Realmente, um dos maiores conflitos era que Batman queria mesmo era ser o homem-borboleta. A trilha sonora era outra, com Donna Summer, Shakira e Village People.

Um abraço e boa semana.