INTRÓITO

Subverter, Exorcizar, Viver, Beijar, Amar, Odiar, Saber, Piratear, Analisar, Mover, Parar, Rejuvenescer, Envelhecer... Tudo isso e nada. Petit Subversion é só um diário de alguém comum - de Anatólia... um fantasma.

domingo, 2 de março de 2008

IDÍLIO LÉSBICO: OS AMORES FEMININOS


“... O suor desce-me em rios pelo corpo, um tremor se apodera de todos os meus membros e, mais lívida que a outonal folhagem, estorcendo-me nas dores da agonia, desfaleço perdida no êxtase do amor.” (Safo de Lesbos)

Velhos assuntos... novas nuances...sempre é bom retomá-los, pois há quem ainda não sabe e o quer saber, viver, sentir ‘as vias de fato’ ... De qualquer forma, esta abordagem é singular e pretende ser inspiradora... A partir deste momento faça de conta que teu olhar é o de Safo e ... deixe-se levar pela emoção...!!
Falarei dos amores femininos, de Safo, de onde surgiu o termo ‘lésbica’ e com isso, misturar um pouco de poesia, mulheres e vinho ...

Safo, a célebre “poetisa” da antiga Grécia, nasceu por volta do ano de 612, na ilha de Lesbos. De formato triangular, a ilha, situada no mar Egeu, era rival dos centros Jônios em riqueza, refinamento e gênio literário. Era tida como o verdadeiro Éden perdido entre pomares e vinhas. O vinho era tão famoso em Lesbos quanto a poesia... Nossa poetisa, uma ardente adepta do idílio lésbico, inspira o amor entre mulheres a ser chamado ‘amor Lésbico’. Portanto, o termo ‘lésbica’, vem de Lesbos, o paraíso natural de Safo.

O nome ‘Safo’ significa ‘voz cristalina’ou ‘brilhante’. Na verdade, tratava-se de uma mulher brilhante, pois seus poemas se tornaram célebres em todo o mundo. Mesmo em sua época (tempo do sexo rei – sociedade ativamente masculina) toda a Grécia erguia hosanas a Safo. Sócrates deu a ela o título de “A Bela” e Platão dedicou-lhe um epigrama: “Há quem afirme serem nove as Musas. Que erro! Pois não vêem que Safo de Lesbos é a Décima?”

“Safo era maravilhosa”, diz Estrabão, “pois em todos os tempos de que temos conhecimento não sei de outra mulher que a ela se tenha comparado, ainda que de leve, em matéria de talento poético.” Em todo mundo grego, Safo, era tida como “a Poetisa”. Com seus dezenove anos apenas, ela começou a tomar parte na vida pública através da política e da poesia. Não era tida como um referencial de beleza: pequena de estatura e frágil de porte, seus olhos e cabelos eram mais negros do que o desejariam os gregos. Mas possuía o encanto da elegância, da delicadeza e do refinamento e um espírito brilhante. Sabe-se, pelos seus versos, que era de temperamento apaixonado e suas palavras, diz Plutarco, “vinham misturadas com chamas.” Um certo sensualismo dava corpo aos entusiasmos de seu espírito. Deveria ser uma mulher muito sedutora...

Entre exílios e retornos, poesia e vinho, Safo casou-se com um rico mercador de Andros, de quem, mais tarde, herdou toda a fortuna do esposo prematuramente falecido e do qual teve uma filha chamada Cleis. Após cinco anos de exílio voltou a Lesbos, onde se tornou a líder da sociedade e do mundo intelectual da ilha. Sedenta de atividade abrira uma escola para moças, às quais ensinava poesia, música e dança. Foi essa a primeira “escola de aperfeiçoamento” da história. Safo chamava suas discípulas não de alunas, mas de hetairai – companheiras (a palavra tomou outro significado com o tempo – amantes). Em sua viuvez apaixonou-se sucessivamente por todas as discípulas. Em um dos seus fragmentos ela diz: “O amor sacudiu-me o espírito como a ventania que passa e abala os grandes carvalhos”.

Entre seus amores encontramos uma de suas discípulas – a favorita – Átis, para quem entoou versos: “Amei-te, Átis, há muitos anos... quando minha mocidade estava ainda em flor, e tu me parecias tímida e ingênua criança”. Este amor, ao que tudo indica foi correspondido, porém, inesperadamente, Átis, aceitou as atenções de um rapaz e Safo sofreu arduamente de ciúmes e um amargor tomou conta de seu coração, quando os pais de Átis retiraram-na da escola. A separação significou uma mortificação para Safo, traduzido neste fragmento: “Nunca mais hei de rever Átis e seria bem melhor para mim se tivesse morrido.” Esta sem dúvida é a autêntica voz do amor, atingindo culminâncias de sinceridade e beleza para além do bem e do mal. Os críticos, até hoje, travam debates para decidir se os poemas sáficos seriam expressões do “amor lésbico” ou simplesmente divagações poéticas e impessoais – o que sei é que são belíssimos. Com ela, a poesia se faz carne e sangue ... brota do próprio corpo. Safo resgatou a mulher do trabalho, do lar, da sua condição de mera procriadora, único lugar que os homens lha reconheciam com legitimidade, ao lado dos escravos. Mostrou as ternuras do coração, dos quais os homens, por desatenção, estavam excluídos.

No ano de 1073 da nossa era, a poesia de Safo foi queimada publicamente pelas autoridades eclesiásticas de Constantinopla e Roma. Curiosamente em 1897 descobriram no Oxirinco, em Faio, caixões funerários feitos de papel-machè (papier-maché) para cuja fabricação haviam sido aproveitadas páginas de livros antigos; entre estas encontravam-se alguns poemas de Safo.

É impossível falar do amor lésbico sem falar de Safo e de sua poesia. Parece estar intrinsecamente ligado o fator ‘poesia’ e o ‘amor’ que as mulheres nutrem por outras mulheres. Seria então, o doce enlace de dois corpos femininos, uma poesia de natural beleza ou um agridoce pecado dos Deuses?!

O Lesbianismo (ou como quer que chamassem) também esteve presente em Roma.
Nos estabelecimentos de banhos, as mulheres se entregavam para o prazer. Conta a história, que existiam escravas especialmente treinadas no amor lésbico – as chamadas fellators. Um nome se eternizou – Bassa, a célebre lésbica romana. Há um provérbio ou ‘dito’ contemporâneo que assim descreveu Bassa: “Ousais unir duas vulvas e, através do simulacro de amor, substituir o homem ausente. Lograis um milagre tão espantoso quanto o mistério tebano: cometer adultério sem a participação do homem”. Dos prazeres romanos, o que temos, o que sabemos ... nada nos faz estranhar, assombrar, acredito, basta assistirmos ao filme Calígula, para entendermos a sede romana. Então, o amor entre as mulheres de Roma, possivelmente, não foi tão belo quanto em Lesbos ... Talvez, nem tenha sido, propriamente, amor – mas desejo... Mesmo assim, neste contexto, não cabem censuras ... todos os espaços são ocupados por Eros!!!

O providencial desfecho faço com as palavras da poetisa Safo. Na verdade, uma carta de amor:

“Muito ela (Átis) chorou ao ter de deixar-me e disse: ‘Oh, como é triste a nossa sorte! Safo, juro que se te abandono, faço-o contra minha vontade’. E eu respondi: ‘Vai e sê feliz, mas lembra-te de mim, pois sabes o quão doidamente te amo. E se vieres a esquecer-me, oh, então hei de lembrar-te o que esqueceste – a vida adorável e cheia de encanto que juntas vivemos. Pois com muitas guirlandas tecidas de violetas e perfumadas rosas adornaste, ao meu lado, tuas esvoaçantes madeixas; e muitos foram os colares feitos de mil flores com que envolveste teu formoso pescoço; e quantas vezes em meu regaço untaste teu corpo jovem e belo, com óleos raros e preciosos. E não havia monte, lugar sagrado ou regato, que juntas não visitássemos; e jamais primavera alguma encheu os bosques de doces rumores ou do melodioso canto dos rouxinóis, sem que nós estivéssemos presentes’”.

Sugestão de leitura: Literatura Grega – Donaldo Schüler.

Boa Leitura. Anatólia Akkale.

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